"Quem não conhece Deus, mesmo podendo ter muitas esperanças, no fundo está sem esperança, sem a grande esperança que sustenta toda a vida" (Spe Salvi - Bento XVI)

sábado, 31 de dezembro de 2011

Homilia do Beato João Paulo II em Vitória, em 1991

Na última postagem deste ano, copio do site da Santa Sé, a homilia proferida pelo Beato João Paulo II, quando visitou o Espírito Santo em 1991, há 20 anos.
VIAGEM APOSTÓLICA AO BRASIL

HOMILIA DO PAPA JOÃO PAULO II
DURANTE A CELEBRAÇÃO DA SANTA MISSA
PARA OS FIÉIS DA ARQUIDIOCESE DE VITÓRIA

Vitória, 19 de Outubro de 1991


“Pedro, colocando-se em pé, na companhia dos Onze, com voz forte” (At 2, 14).


1. As leituras da liturgia de hoje nos conduzem às portas do Cenáculo de Jerusalém, no dia de Pentecostes. Pedro toma a palavra: “Homens da Judéia e vós todos que habitais em Jerusalém... Que toda a casa de Israel saiba, portanto, com a maior certeza, que este Jesus, que vós crucificastes, Deus o constituiu Senhor e Cristo” (At 2, 14.36).

Na ressurreição de Cristo, Deus revelou que ele é o Messias, o “Ungido” com a plenitude do Espírito Santo. N’Ele se cumpriram plenamente as promessas feitas na Antiga Aliança a Abraão, e transmitidas através de Moisés e dos Profetas.

É Ele que vem ao mundo como luz: “Deus de Deus, Luz da Luz”. Às portas do Cenáculo de Jerusalém, a Igreja começou sua evangelização, que deve chegar até os mais distantes confins da terra. Os Apóstolos e seus sucessores, levarão a luz, que é Cristo, a todos os homens, a todos os povos e a todas as nações.

Queridos irmãos e irmãs deste Estado do Espírito Santo e todos que aqui vieram do Rio de Janeiro, de Minas Gerais, do sul da Bahia e de outros lugares! O Papa se sente feliz no dia de hoje. Veio ele conhecer uma das mais antigas comunidades na história da Igreja no Brasil. Começou ela, de fato, em 1541 com a chegada a esta terra do padre diocesano, Francisco da Luz, primeiro e zeloso pastor da recém-fundada Paróquia de Nossa Senhora da Vitória. Esta comunidade foi santificada pela presença do Beato José de Anchieta que passou neste Estado os últimos anos de sua vida missionária e faleceu no final do século dezesseis na aldeia indígena de Reritiba, que é hoje a cidade que leva o seu nome. Aqui viveu, na mesma época, o homem de Deus, frei Pedro Palácios, o virtuoso irmão leigo capuchinho, catequista e eremita, cuja ermida branca, no alto do rochedo, é hoje o Santuário de Nossa Senhora da Penha, padroeira deste Estado.

2. Cristo é a luz do mundo. “Quem me vê, vê aquele que me enviou”(Jo 12, 45). Cristo, o Verbo eterno, é o Filho consubstancial ao Pai e imagem do Pai, é Deus de Deus. Ele diz: “Quem crê em mim, não é em mim que crê, mas naquele que me enviou”(Jo 12, 44). “O próprio Pai... me ordenou o que devo dizer e falar... As coisas, pois, que eu digo, digo-as como meu Pai me disse” (Jo 12, 49-50).

Pedro e os Apóstolos, às portas do Cenáculo de Jerusalém, começam a anunciar a palavra recebida de Cristo, a palavra que vem do Pai. Esta Palavra é a Boa Nova, ou seja o Evangelho. É a verdade sobre a salvação eterna do homem em Deus. Cristo diz: “Não vim para condenar o mundo, mas para salvá-lo”... “Eu vim ao mundo como uma luz para que todo o que crê em mim não permaneça nas trevas” (Jo 12, 47. 46).

Os que escutavam a Pedro no dia de Pentecostes, depois de ter ouvido a verdade sobre Cristo, converteram-se e fizeram-se batizar. Da palavra sobre a verdade evangélica, nasceu a Igreja como comunidade de batizados no Espírito Santo.

Como aqueles primeiros que se aproximaram de São Pedro no dia de Pentecostes, também nós fomos batizados. E através do Batismo, Deus nosso Pai, tomou posse de nossas vidas, incorporou-nos à Vida de Cristo e mandou-nos o Espírito Santo. O Senhor, diz a Sagrada Escritura, salvou-nos “fazendo-nos renascer pelo batismo, renovando-nos pelo Espírito Santo, que Ele derramou copiosamente sobre nós por Jesus Cristo Salvador nosso, para que, justificados pela graça, cheguemos a ser herdeiros da vida eterna conforme a esperança que possuímos” (Tt, 3, 5-7).

3. Quando o Espírito Santo desceu sobre os apóstolos, no dia de Pentecostes, entre eles estava a Mãe de Cristo. Junto a eles, perseverava Ela em oração desde o dia em que Cristo, tendo partido para o Pai, ordenou-lhes que esperassem juntos o Consolador. 



quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Dos escritos de Santa Teresa do Menino Jesus

Extraído do livro "História de uma Alma - manuscritos autobiográficos", pp. 97 a 100.

Meu coração, sensível e amoroso, facilmente se teria rendido, caso deparasse com um coração capaz de compreendê-lo... Tentei ligar-me a meninas de minha idade, principalmente a duas entre elas. Tinha-lhes amor, e elas por sua vez me amavam tanto, quanto eram capazes de fazê-lo. Mas que lástima! Como é mesquinho e violável o coração das criaturas!!!... Não demorei a perceber que o meu amor era incompreendido. Uma de minhas amigas precisou procurar a família, e voltou alguns meses depois. Durante sua ausência, pensava nela e guardava cuidadosamente um anelzinho que me dera. Quando tornei a ver minha companheira, grande foi minha alegria, mas não obtive, ainda mal, senão um olhar indiferente... Meu amor não fora compreendido. Percebi-o, e não mendiguei uma afeição que me era negada. O Bom Deus, porém, deu-me um coração tão leal que, amando com pureza, ama para sempre. Por isso, continuei a rezar pela minha companheira, e ainda lhe tenho afeição... Ao ver que Celina queria bem a uma de nossas mestras, quis imitá-la, mas não pude consegui-lo, pois não sabia conquistar as boas graças das criaturas. Ó ditosa ignorância! Como me livrou de grandes males!...

Quanto não agradeço a Jesus de me fazer encontrar só "amargura nas amizades da terra"! Como um coração como o meu, deixar-me-ia seduzir e cortar as asas. Como poderia, então, "voar e repousar" (Sl 54,7)?. Como pode unir-se intimamente a Deus, um coração entregue à afeição das criaturas?... Tenho o sentimento de que não é possível. Sem beber da taça envenenada do amor por demais ardente das criaturas, sinto em mim que não é possível estar enganada. Vi tantas almas que, seduzidas por essa falsa luz, esvoaçaram como míseras mariposas e queimaram suas asas. Depois, volveram-se à verdadeira e meia luz do amor. Esta lhes deu novas asas, mais brilhantes e mais ligeiras, a fim de poderem voar para junto de Jesus, Fogo Divino, "que arde sem se consumir" (Ex 3,2 e São João da Cruz, Chama viva de amor).

Ah! eu o sinto, Jesus conhecia-me como fraca demais para me expor à tentação. Talvez, deixar-me-ia queimar toda inteira pela luz enganadora, se a visse fulgurar diante dos olhos... Não aconteceu assim. Só encontrei amargura, onde almas mais robustas deparam com alegria, e desta se desfazem por fidelidade. Não tenho, portanto, nenhum mérito em me não ter entregue ao amor das criaturas, uma vez que só fui preservada pela grande misericórdia do Bom Deus!... Reconheço que, sem ele, poderia cair tão baixo como Santa Madalena. E com grande doçura ecoa em minha alma a profunda palavra de Nosso Senhor a Simão... Eu o sei, "menos AMA aquele a quem menos se perdoa" (Lc 7,47). Mas, não ignoro também que a mim Jesus perdoou mais que a Santa Madalena, pois me perdoou por antecipação, porquanto me impediu que caísse. Oh! pudera explicar o que sinto!... Dou aqui um exemplo que traduzirá um pouco meu modo de pensar. - Suponho que o filho de um entendido doutor depare no caminho com uma pedra, que o faz cair e fraturar um membro. De pronto lhe acorre o pai, ergue-o com amor, pensa-lhe as feridas, aplicando todos os recursos de sua arte. E o filho, completamente curado, logo lhe testemunha sua gratidão. Não resta dúvida, o filho tem todo o motivo de querer bem ao Pai! Farei, contudo, outra suposição ainda.

- Sabendo que no caminho do filho se encontra uma pedra, o pai apressa-se em tomar a dianteira, e remove-a, sem que ninguém o veja. O filho, por certo, objeto de seu previdente carinho, não TENDO CONHECIMENTO da desgraça, da qual o pai o livrara, não lhe mostrará gratidão, e ter-lhe-á menos amor do que se fora curado por ele... Mas se vem a conhecer o perigo, do qual acaba de escapar, não o amará mais? Ora, tal filha sou eu, objeto do amor previdente do Pai, que enviou seu Verbo para resgatar não os justos, mas os pecadores (Mt 9,13). Quer que o ame, porque me perdoou, não digo muito, mas TUDO. Não esperava que eu muito o amasse, como Santa Madalena, mas quis que SOUBESSE como me amou com um amor de inefável previdência, a fim de que agora o ame até a loucura!... Ouvi dizer que se não encontra alma pura mais amorosa do que uma alma arrependida. Oh! Quem me dera desmentir esta afirmação!...

sábado, 24 de dezembro de 2011

Homilia do Beato João Paulo II na Santa Missa do Galo de 1981

SANTA MISSA DA MEIA-NOITE DO NATAL DE 1981

HOMILIA DO PAPA JOÃO PAULO II
Basílica Vaticana, 24 de Dezembro de 1981

"... Um menino nasceu para nós, um filho nos foi dado, que tem a soberania sobre os seus ombros" (Is 9, 5).


1. Nasce um Menino.

Reunimo-nos nesta veneranda Basílica — como se reúnem tantos outros nossos irmãos e irmãs na fé, no dia de hoje à meia-noite, no mundo inteiro — porque nasce um Menino.

Ele vem ao mundo do seio da Mãe, assim como tantos meninos humanos desde o princípio e continuamente...

Nasce...

quando estava a decorrer o recenseamento ordenado em todo o Império romano por César Augusto, quando José da Galileia da cidade de Nazaré teve de deslocar-se a Belém, dado que era da casa e linhagem de Davi; e Belém era exatamente a cidade de David.

Estando lá, completaram-se para Maria os dias de ela dar à luz. Nasce, pois, o Menino — Filho primogênito de Maria de Nazaré. A Mãe envolveu-O em panos e colocou-O numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na hospedaria.

Embora único e irrepetível, pela Sua divindade e pela Sua concepção e nascimento virginal, o Menino nasceu como nascem os filhos dos pobres. E isso não havia sido predito por Isaías, embora ele tivesse prenunciado tal nascimento, no meio de uma noite profunda, quando escreveu: "O povo, que caminhava nas trevas, viu uma grande luz; aos que habitavam na região tenebrosa resplandeceu uma luz brilhante" (Is 9, 2).

2. Todos nós, aqui reunidos, como todos os nossos irmãos e irmãs espalhados pelo mundo inteiro, viemos ao encontro desta luz: Foi-nos dado um filho, Filho da luz: Deus de Deus, Luz da Luz. Sim, um filho nos é dado: "Porque Deus — Pai Eterno — amou de tal modo o mundo, que lhe deu o Seu Filho único..." (Jo 3, 16).

E eis chegado o momento em que se revela ao mundo o Dom do Pai: um Filho.



quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

A medicina preventiva das almas

Ultimamente têm-se dado especial destaque à medicina preventiva, inclusive com alterações polêmicas no quadro de disciplinas da graduação de Medicina. Em nossos dias, a Saúde Coletiva (ou Medicina Social) ocupa 25% da carga-horária. Estas matérias têm, entre outras finalidades, a de preparar o médico para atuar na prevenção, ou seja, antes que a doença seja contraída. Também nesse caminho seguem todas as outras disciplinas. Vivenciamos um novo movimento curricular nos cursos de graduação médica, que pretende tornar a medicina preventiva cada vez mais importante em comparação com a chamada medicina curativa, que é a tradicional, aquela em que o médico prescreve um tratamento para uma doença já instalada.


Fico pensando: por que não se podem aplicar esses princípios também para as almas? Sim, enquanto vivemos neste mundo, estamos sujeitos a um sem-número de intercorrências espirituais que podem desviar a alma de seu fim último, isto é, a salvação. Se a doença causa prejuízos ao corpo, o pecado causa prejuízos à alma. Se o prejuízo ao corpo, que é um prejuízo temporal, deve ser evitado a todo custo - assim dizem mesmo as autoridades médicas - quanto mais o prejuízo à alma, que gera conseqüências eternas.


Para a alma que vive neste Desterro, as situações próximas de pecado devem ser a todo custo evitadas, as coisas materiais devem ser ordenadas para favorecer a salvação e a oração deve ser multiplicada a fim de fortalecer a alma contra os dados inflamados do maligno, como diz São Paulo, na carta aos Efésios. Muitos objetam, porém, que isso não se pode fazer pois que somente ao custo de muito sofrimento se consegue evitar certos pecados, particularmente a gula e os pecados contra a castidade. Todavia, se o médico lhes diz que, a fim de evitar a hipertensão arterial, devem abster-se de sal ou para evitar as complicações do diabetes, devem diminuir a ingestão de açúcar, tomam logo as providências para cumprir as metas, embora nem sempre se consiga isso, como sabemos.


Também no caso de campanhas de vacinação em massa, as mães se ocupam de levar as crianças o mais rápido possível porque querem assegurar a prevenção de certas doenças infecciosas, e ainda, as mulheres fazem filas em frente aos postos de saúde para a mamografia e o exame preventivo contra o câncer de colo de útero todos os anos (na idade em que há indicação médica para isso). As pessoas aplicam toda a diligência nesses cuidados de saúde, cuidados preventivos. Sem falar da prática de atividades físicas que atualmente é encarada como uma arma indispensável na prevenção de enfermidades as mais diversas possíveis. Mesmo quem não cumpre as determinações médicas de prevenção, se perguntado, dirá que gostaria de cumprir, embora não tenha ânimo para tanto.


Mas e quanto a evitar o pecado? Por que as pessoas - todos nós - não cuidamos da nossa alma com o mesmo zelo que dedicamos aos nossos corpos? Ou, melhor ainda, porque não fazemos medicina preventiva com relação ao que de mais sagrado temos, ou seja, a Eternidade?


Vejo que nos maços de cigarros, por exemplo, por determinação do Governo, foram colocadas fotografias que mostram desde uma boca com os dentes apodrecidos até um pulmão canceroso. Vendo as fotos, o cidadão pode mais facilmente evitar o fumo e, assim, proteger-se de alguma maneira contra certas moléstias. Mas e o inferno? Não será muito mais assustador do que um câncer de pulmão? Todos nós, penso eu, merecemos uma campanha continuada de conscientização sobre o pecado e as suas conseqüências para a alma. Se pudermos recordar sempre do que nos falou Jesus, do que nos contaram os santos e do que ensina a Igreja sobre o inferno sem dúvida que poderemos ter mais êxito na luta contra o pecado. Se é lícitoútil fazer isso contra o câncer, por que não seria útil fazer contra a perdição eterna, que é muito mais grave?


Há ainda outros modos usados. Se vemos as conseqüências negativas do cigarro, etc., também vemos, por exemplo, propagandas ou campanhas que mostram idosos "bem-conservados", fortes e sadios, mesmo aos noventa ou cem anos até. Perguntados sobre o segredo de manter a boa-forma, eles logo falam sobre a boa alimentação, a leitura, o combate aos vícios, a prática de esportes. Ora, de igual modo, devemos meditar sobre o Céu. Pensar em todos os benefícios que nossa alma terá quando lá chegar, a visão beatífica de Deus, a presença de todos os santos, dos apóstolos, de Nossa Senhora, a felicidade incomparável e sem fim. Se é útil lembrar da felicidade que se pode ter na velhice mantendo bons cuidados para com o corpo, também o é lembrar do Céu onde se pode ter gozo sem igual.


Enfim... acho que devemos nos conscientizar sobre os males da alma e também os bens eternos para que, lembrando e meditando continuamente sobre eles, nos apliquemos com todo o empenho no combate às paixões desordenadas, aos vícios do espírito, às más-inclinações. Se abster-se de pecados, fazer penitências ou rezar podem nos causar sofrimento, pensemos na recompensa que teremos e no mal que evitaremos e ficará claro que vale a pena o esforço. Além disso, se alguém disser que não quer fazer esforço porque "Deus nos quer felizes agora" então, faço uma sugestão: coma gordura de carne todos os dias, fume pelo menos um maço de cigarro por dia, capriche no sal nos seus alimentos, não faça exercícios físicos que te sejam forçados e desagradáveis (porque há também esportes que nos causam prazer, evidentemente) e, se for mulher, não faça mais mamografias ou exames preventivos quaisquer. Assim você estará sendo coerente. Cuidar do corpo e esquecer da alma não é coerente. Apliquem-se as mesmas diligências ao corpo e à alma pois que o ser humano integral é formado de corpo e alma unidos e inseparáveis a não ser pela morte temporal.


Nesse advento, vamos aproveitar também para meditar sobre o que estamos fazendo para prevenir a perda da saúde da alma, com a conseqüente separação do amor de Cristo. Vamos reforçar os exames de consciência, intensificar nossas orações e súplicas e fazer de nossa vida uma oblação enquanto nos preparamos para o Natal e para a vinda definitiva de Nosso Senhor, pedindo com a vida e com a boca: "Adveniat regnum tuum".

domingo, 11 de dezembro de 2011

Por que não encontro Jesus? Onde Ele está que não me responde?

Muitas vezes, para não dizer quase sempre, Jesus parece estar distante, oculto, inacessível. Quantas vezes rezamos e pedimos auxílio, mas temos a impressão de que Deus não nos escuta, não nos responde, não nos vê. Onde está Ele? Onde posso encontrá-lo?

O Santo Padre Bento XVI ensinou que Jesus propõe a estrada da sabedoria do Evangelho, que não é uma doutrina a se aprender ou uma proposta ética, mas uma Pessoa: Ele mesmo, o Filho Unigênito em perfeita comunhão com o Pai (1).

Não quero aqui encontrar qualquer solução "teológica". Mas, ao que me parece, não encontramos Jesus, às mais das vezes, porque não temos as disposições interiores necessárias para tal. Queremos que Deus seja acessível aos nossos sentidos, que seja visível, palpável, sensível de alguma forma. Esquecemos assim que Ele é o Todo-Poderoso, o Criador de todas as coisas visíveis e invisíveis (2) e, pior ainda, fazemos uma idéia grande de nós mesmos, a ponto de nos julgarmos capazes de ver a Deus. Jesus mesmo, no hino de júbilo, diz: Pai, eu te louvo porque escondestes essas coisas aos sábios e inteligentes as e revelastes aos pequeninos (cf. Lc 10:21). E, em outro lugar: Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração (cf. Mt 11:30).

Ora, devemos abandonar nossa presunção, nossas idéias de grandeza e nos fazermos pequenos para não corrermos o risco de não ver a Deus quando Ele se manifesta bem pertinho de todos nós, diariamente. Somente se formos como uma criança (cf. Mc 10:15) poderemos encontrá-Lo realmente. 



sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Dos escritos de Santo Ambrósio: A graça de tuas palavras conquiste o povo

Fonte: blog Maranatha (tradução, destaques e adaptações nossos)

A graça das tuas palavras conquiste o povo 

Das cartas de Santo Ambrósio, bispo

Recebeste o sacerdócio e, estando à popa da Igreja, guies o barco sobre as ondas. Equilibres o timão da fé de modo que as violentas tempestades deste mundo não possam perturbar o seu curso. O mar é realmente grande, sem limites; mas não tenhas medo, porque “é Ele que a fundou sobre os mares e sobre as ondas a estabeleceu” (Sl 23,2).

Por isso não sem motivo, entre as tantas correntes do mundo, a Igreja continua imóvel, construída sobre a pedra apostólica, e permanece sobre seu fundamento firme contra o enfurecido mar em tempestade. É agredida pelas ondas mas não se agita e, embora com freqüência os elementos deste mundo quebrem-se em grandes colisões retumbantes, Essa tem todavia um porto seguro de salvação onde acolher aqueles que estão cansados. Se, pois, a Igreja é sacudida pelas ondas do mar, anda tranqüila sobre os rios, sobre aqueles rios sobretudo dos quais foi dito: “levantam os rios a sua voz” (Sl 92,3). Há, de fato, rios que fluem do coração daqueles que foram saciados por Cristo e receberam o Espírito de Deus. Estes rios, quando abundam de graça espiritual, levantam a sua voz.

Há, pois, um rio que se derrama sobre seus santos como um torrente. Qualquer um que tenha recebido a plenitude deste rio, como o evangelista João, como Pedro e Paulo, levanta a sua voz; e como os apóstolos difundiram sua voz da pregação evangélica com jubiloso anúncio até os confins da terra, assim também este rio começa a anunciar o Senhor. Receba-o então de Cristo, para que também a tua voz se faça ouvir.

Recolhe a água de Cristo, aquela água que louva o Senhor. Recolhe de mais lugares a água que deixam cair as nuvens dos profetas. Quem recolhe e transmite a água das montanhas para si, ou atinge as fontes, ele mesmo como as nuvens a derrama sobre os outros. Preenche então o fundo da tua alma, para que o teu terreno seja irrigado e regado de fontes próprias. Se preenche quem lê muito e penetra o sentido do que lê; e quem está preenchido pode irrigar outros. A escritura diz: “se as nuvens são cheias de água, a derramam sobre a terra”.

Os teus sermões sejam fluentes, puros, cristalinos, que teu ensinamento moral seja doce às orelhas das pessoas e a graças das tuas palavras conquiste os ouvintes, para que te sigam docemente onde tu lhas conduz. Teu falar seja pleno de sabedoria. Também Salomão afirma: “Os lábios dos sábios são as armas da Sabedoria (cfr. Pr 15,7), e ainda: teus lábios sejam bem aderentes à idéia: vale a dizer, a exposição dos teus discursos seja lúcida, brilhe claramente o sentido sem que haja necessidade de explicações adicionais; o teu discurso se saiba sustentar e defender por si mesmo e não saia de ti palavra vã ou privadas de sentido.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

A Virgem Maria e o pecado original


Texto de Dom Henrique Soares da Costa, bispo auxiliar de Aracaju-SE. Nossa Senhora da Conceição, rogai por nós. 

Ao celebrarmos a Imaculada Conceição da Virgem Maria e os cento e cinqüenta anos da proclamação do dogma, é oportuno compreender o significado da doutrina do pecado original, pecado do qual a Virgem foi isenta desde o primeiro momento de sua existência.

Antes de tudo, é necessário compreender bem que somente poderemos ter uma noção do pecado e da sua gravidade quando possuímos uma noção da grandeza do amor que Deus nos concedeu e ao qual nos chamou em Jesus Cristo. É contemplando a cruz que poderemos ter uma idéia do quanto o pecado atingiu toda a humanidade e do quanto ele é danoso e trágico. Então, não é primeiramente o Gênesis que nos revela o pecado, mas o fato de Jesus ter amorosamente morrido por todos nós para nos libertar de uma situação de escravidão: “Todos pecaram e todos estão privados da glória de Deus e são justificados gratuitamente, por sua graça, em virtude da redenção realizada em Cristo Jesus (Rm 3,23). O pecado original é aquela situação de atoleiro no qual a humanidade se encontra, da qual não pode sair por si mesma e da qual somente Cristo nos pode arrancar: “Eu sou carnal, vendido como escravo ao pecado. Realmente, não consigo entender o que faço; pois não pratico o que quero, mas faço o que detesto. Na realidade, não sou eu mais o que pratico a ação, mas o pecado que habita em mim. Infeliz de mim! Quem me libertará desse corpo de morte? Graças sejam dadas a Deus, por Jesus Cristo Senhor nosso” (Rm 7,14s.24s).

domingo, 4 de dezembro de 2011

A indissolubilidade do matrimônio cristão. Explica-nos o Cardeal Ratzinger




A propósito de algumas objeções contra a doutrina da Igreja sobre a recepção da Comunhão Eucarística da parte de fiéis divorciados recasados 
Joseph Card. Ratzinger

A Carta da Congregação para a Doutrina da Fé sobre a recepção da Comunhão eucarística da parte de fiéis divorciados recasados, de 14 de Setembro de 1994, teve um forte eco em diversas partes da Igreja. Em paralelo com muitas reacções positivas ouviram-se também não poucas vozes críticas. As objecções essenciais contra a doutrina e a praxe da Igreja são apresentadas a seguir de forma simplificada.

Algumas objecções mais significativas – sobretudo a referência à praxe considerada mais flexível dos Padres da Igreja, que inspiraria a praxe das Igrejas orientais separadas de Roma, assim como a chamada aos princípios tradicionais da epiqueia e da «aequitas canonica» ­ foram estudadas de modo aprofundado pela Congregação para a Doutrina da Fé. Os artigos dos Professores Pelland, Marcuzzi e Rodriguez Luño (2) foram elaborados durante este estudo. Os resultados principais da pesquisa, que indicam a orientação de uma resposta às objecções feitas, serão aqui igualmente resumidas.

1. Muitos consideram, alegando alguns trechos do Novo Testamento, que a palavra de Jesus sobre a indissolubilidade do matrimônio permite uma aplicação flexível e não possa ser classificada numa categoria rigidamente jurídica.


Alguns exegetas realçam criticamente que o Magistério em relação à indissolubilidade do matrimónio citaria quase exclusivamente uma só perícope – isto é Mc 10, 11-12 – e não consideraria de modo suficiente outros trechos do Evangelho de Mateus e da primeira Carta aos Coríntios. Estes trechos bíblicos mencionariam uma certa «exceção» à palavra do Senhor sobre a indissolubilidade do matrimônio, isto é, no caso de «pornéia» (Mt 5, 32; 19, 9) e no caso de separação por motivo de fé (1 Cor 7, 12-16). Estes textos seriam indicações de que os cristãos em situações difíceis teriam conhecido já no tempo apostólico uma aplicação flexível da palavra de Jesus.